sexta-feira, 22 de julho de 2011

O primeiro voo

Hoje sinto-me particularmente introspectivo e só...
Ontem aconteceu-me algo bastante insólito, que me deixou a pensar e com um peso de culpa no coração. Foi assim: quando cheguei ao local trabalho e estacionei o carro mesmo à porta deste; o meu local trabalho localiza-se no Largo da Igreja Matriz e em frente existem quatro enormes tílias, onde as rolas turcas nidificam, ouvi rumorejar de asas nas tílias, pareceu-me que uma das rolinhas estava presa em qualquer coisa (as tílias são utilizadas para colocar todo o tipo de cordas, cordinhas, baraços, baraçozinhos, tamiços, tamiçozinhos, bem como fios eléctricos, cabos de aço e outras porras que se usam nas festas), e como a Noite Branca vai ter início no dia 29 do corrente, presumi que o passarinho estava preso num destes artefactos e fui ver. Nada disso, era o bater de asas do “pollito”, lutando com o maninho(a) pela comida da mãe.
Quando deram pela minha presença, levantaram voo e um dos pássaros não se apercebeu da parede, alva, do edifício do outro lado do largo e irremediavelmente, embateu na parede e catrapus, caiu no pavimento onde passam os automóveis, pareceu-me a mim que atordoado e corri a socorre-lo para que não lhe passasse nenhum automóvel por cima.
Apanhei-o do chão; estremunhado como sem saber bem o que se passou, cuidadosamente, examinei-o e olhei-o nos olhos e vi aquele olhar triste no meu olhar e de sus deixou cair a cabeça e começou a regurgitar...
Segundos depois morreu entre as minhas mãos, sem que antes abrisse os olhos e me olhasse nos olhos. Foi um instante; foi a vida que me levou a vida que detinha entre os dedos e, escorreu entre eles caindo sabe Deus onde…,  porém deixou-me incomodado e com um sentimento de culpa no coração, "porque tocas tu rabecão sapateiro", por outras palavras porque fui meter o nariz onde não era chamado...
Sou caçador e pescador, mas esta situação magoou-me muito, não sei bem porquê mas interferiu e interfere ainda nos meus dias e nas minhas noites... apanho-me a pensar na rolinha que no seu primeiro e efémero voo, não chegou a sentir o que é realmente liberdade, foi-lhe sonegado o sonho mesmo antes de ele acontecer, e atirada ao lixo; que fazer? como se nada e de nada se tratasse...
Apesar de, ainda hoje, esta vivência se encontrar absurdamente vívida, não me deixa de assolar a ideia: “afinal nada mais se trata que mais um animal esborrachado na estrada…”, contudo a consciência de mim acusa-me de insensibilidade e irresponsabilidade ao querer tratar este, como mais assunto irrelevante, pois a bem da verdade, ainda que na melhor das intenções e delas está o inferno cheio, o vector “responsável” aponta na minha direcção. E, aqui, não admito a culpa a morrer solteira! “mea culpa”!  
Hoje reflicto e pondero... e se fosse um filho(a)?...

tÓ mAnÉ

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