Não,
não! Eu não te engano, como também não me engano a mim mesmo, faz anos que o
engano é uma parte de mim. A minha vida não deixa margens para dúvidas ou
erros, tu conhece-la bem; a saúde, as dores, o medo, tu e a nossa filha e o trabalho
ou aquele que não faço mas me impõe a obrigação.
Se
não fosse a nossa filha, deixava esta vida, deixava os medicamentos e
deixava-te metade do que tenho e, com a outra largava pelo mundo fora, bebia
até perder a consciência, escrevia até me doer o último reduto do pensamento e
cair exausto sobre o vómito do que bebi e escrevi, pois nenhuma seria a
diferença.
E
por falar em diferença, de quando em quando ou de quando em vez, e quando fosse
atacado pela vertiginosa tesão, irresistível, de uma mulher, faria o que
marcaria a diferença, contrataria os serviços de uma prostituta ou de uma
mulher a soldo, coisa que até hoje nunca fiz ou pelo menos abstraídos e
subtraídos os favores prestados, por aquelas que assim se não dizem, talvez bem
mais e melhor cobrados o foram.
E,
assim, de charco em charco, acabaria os meus dias ou aqueles que me restassem,
bem mais rápido, mas de certo com um sorriso entre lábios entrecortado e quiçá
tivesse encontrado nele a mísera verdade de ter sido o que perdi; ser feliz!
Mas
por vos amar não me posso amar a mim e neste mar sem sentido nem fim vou
vogando umas vezes mal outras assim-assim.
tÓ
mAnÉ Editions
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