Trim-trim, trim-trim…
- Está lá…
- Sim, é a Laura!...
- Eu sei claro…
- Não, não me esqueci, vou-a escrever!...
- Tchau.
Oops… Já
começaram as reclamações por andar atrasada com as minhas crónicas. Não fazia
ideia de ter tantos leitores. Obrigada!
Devo esclarecer
que a culpa não é minha mas sim do meu papá que anda armado em calão e, também,
porque tem andado atarefado lá com as coisas dele, que devem ser muito
importantes, pois passa horas fechado no escritório às voltas com o computador.
Na verdade
encontro-me ansiosa e também receosa por recomeçar, apesar de ter feito umas
notitas ou cábulas, pois muita coisa irá por certo ficar esquecida ou por dizer
ou menos bem relatada ou até mesmo ferida de algumas imprecisões. Todavia, e
alfim, o importante mesmo é escrever ou descrever as coisas boas e más que me ou
nos aconteceram.
Sexta-feira a
minha mãe foi buscar-me à escolinha e depois fomos para o Parque Municipal
brincar, quero dizer eu brinquei e a minha mãe andava atrás de mim, feita
polícia (daqueles que põem as multas quando se não põe o “ticket” no tablier do
carro) e, por acaso, até estava trajada de azul. Vigilante chamava-me,
amiudamente, à atenção para certos perigos e pormenores, aliados àqueles “aparelhómetros”
fixes: escorregas, baloiços, balancés de mola, cordas que mais parecem teias de
aranha, passadiços, varões, etc…
Até existe, no
parque infantil, um repuxo que hoje em dia todos chamam de bebedouro e que,
antigamente era usado para dar água aos animais, enquanto o pastor bebia nas
fontes, bicas, poços; acho que voltámos ao estatuto de animal mesmo, basta que
vejamos o comportamento de quem nos manda ou diz que o faz.
Tem também um
chão muito fixe e bonito, vermelho, molinho, porém quando caímos ficamos com a
pele queimada e muitas tampas de caixas em ferro que quando caímos em cima
delas podemos fazer um dói-dói na cabeça, é perigoso, não acham?
Outra coisa que
não percebi é porquê que as casas de banho junto ao parque infantil não têm
aparelhos sanitários para crianças, pelo menos uma sanita e um lavatório, quer
para os meninos quer para as meninas. Será que os Srs. que fizeram os ”mnecos”,
quero dizer os desenhos ou os projectos, só se lembraram dos grandes, porque
são grandes, será, será?...
Constatei estes
factos por experiência própria, o primeiro quando aterrei sobre o tapete de
agregado emborrachado, queimando as minhas mãos, o outro quando
inadvertidamente caí sobre uma tampa de ferro e esfolei o joelho, mas como sou
uma menina muito forte não chorei nem nada, e por último quando, aflitinha, fui
à casa de banho das meninas, e bolas! Não fora a minha querida mamã tinha feito
um xixi nas cuecas, pois as sanitas eram desadequadas à minha condição de
criança com três aninhos, o mesmo se poderá dizer dos lavatórios, ai, ai, ai,…
vamos lá a mudar isto, afinal no parque infantil, e tal como refere o nome,
existem muitas crianças, acompanhadas de adultos é certo mas crianças e nós
crianças somos pequenas e pequeninas…
Deixando para
trás estes pequenos reparos devo dizer que: adoro parques infantis! São um
mundo de diversão e descoberta, de erro e tentativa, de frustrações e vitórias,
enfim um mundo que nos faz crescer mais saudáveis e criativos onde cada corrida
é um amigo, onde cada escorregadela é um sorriso, onde cada baloiçada é um
grito efusivo de alegria, onde cada pausa para descansar é um carinho, onde a
rebeldia é premiada por mais uns longos minutos de permanência no campo de
batalha, onde eu sou ao mesmo tempo a princesa e a guerreira, até que a mamã
volte de novo à carga com o: vamos Laura que já se faz tarde.
Finalmente os
argumentos acabam e o inevitável acontece, a mamã agarra-me ao colo e, sob
contestação, eu ainda peço, esperançosa, uma vez mais: só mais um bocadinho,
mas já não cola. E, aí, em desespero de causa lanço mão do meu último argumento
do meu último recurso e choro. É sempre assim, irremediavelmente, que terminam as
visitas ao parque infantil: em grossas lágrimas e veementes protestos.
Aqui vou eu
direitinha ao carro, mais aborrecida que um peru em véspera de consoada, para
logo de seguida ser presa à cadeirinha e a minha mãe tirar o azimute a casa. Não
é justo eu queria ficar só mais um bocadinho ou melhor até ser noite, não era
pedir muito para quem está a crescer como eu.
Chegada a casa,
ainda amuada, mas já conformada, deu-se início ao ritual de fim de tarde, com
uma ligeira diferença ou nuance, hoje é a mamã que está a tratar dos cães. Calçada
de galochas e carregando o balde dos torrões lá vai a mamã em direcção ao canil…
e eu, bem eu também quero ir, era o que mais faltava eu não ir, eu já sou
grande e quero ver os meus cães; eles são lindos, não vou mais falar deles
porque já conhecem as peças de artilharia aqui das minhas crónicas de FDS.
Guerra armada, pois claro! A minha mãe não quer que eu vá. Tem medo que eu caia
ou que os cães me façam cair. Que eu me aleije: já não chegou o parque, diz
ela, com ar de poucos amigos. Por fim lá se salvou a honra do convento com a
chegada da tia Vitalina que me pegou na mão e me livrou de todos os perigos do
mundo e me consolou ou expiou a frustração que se acumulou com o crispar do
diálogo.
Esquecida; eu
esqueço rapidamente, da situação e sem guardar qualquer tipo de rancor, desatei
de novo na brincadeira e quando a mãezinha voltou atirei-me nos seus braços
louca de contentamento e aos beijinhos. Adoro a minha mãezinha querida.
Enquanto a mãe
estava no canil e os cães, loucos, corriam por todo o lado, felizes por uns
momentos de liberdade ainda que efémera, aconteceu algo muito estranho e que eu
não entendi muito bem apesar de ter provocado a risota geral. Foi assim: O Goya
saltou para cima da Lucy a vá da dar ao rabo, “zunga, zunga, zunga”,… deitando
para fora, assim como a mãe faz com o batom, uma enorme pilinha (a avó Ilda é
que disse que era a pilinha dele) vermelha arroxeada. Estão a rir?... Haviam de
ver. Aposto que também ficariam admirados. O Goya é pequenino e com aquela
coisa enorme, pendente, a rojar pelo chão, arfando e babando, olhem que até
fiquei a pensar que ele estava doente. Vejam bem que a Lucy até lhe rosnou,
mordeu e fugiu. Pela certa a coisa era séria e perigosa ou pelo menos nessa
qualidade o entendeu a cadelinha e ela não é parva nenhuma, não.
Incidentes
esquecidos e retoma da vida na sua plena normalidade: Banho, jantar, “mnecos” e
compartimento da penumbra e esquecimento. Será que, como disse Shakespeare “Somos feitos da mesma matéria que os sonhos”?...
A manhã de sábado
foi madrugadora, nasceu cedo. Gosto de acordar cedinho, fica mais tempo para a
brincadeira e para os “mnecos”. A mãe levanta-se sempre comigo, já do meu pai
não posso dizer o mesmo. Mas hoje foi diferente. Não é que o maroto se levantou
cedo outra vez. Mas eu sei porquê: Vai para as benditas aulas de pintura.
Sempre quero ver se tem jeito para a arte dos pincéis e da tinta. Hoje
supostamente vão acabar os garatujos. Aleluia! Estou farta de ficar os sábados
de manhã em casa. A
fazer de tudo e de nada e de tudo um pouco e a ver sobretudo “mnecos”. Quando o
tempo já vai de praia, está um colorzinho fixe, isto é um desperdício, não
acham?... Bem, vamos lá ver o que é que a fruta vai render, diz o povo.
Não é que eu não
aprecie ficar em casa com a minha mãe mas nem tanto ao mar nem tanto à terra.
Variar é o conduto da vida, dá-lhe aquele gostinho a aventura e faz o coração
bater mais forte e rápido.
Ora vamos lá ver
o que nos reserva a tarde, até porque nesta lufa-lufa o tempo voou e o papá já
apareceu por aqui ou seja chegou e a hora de almoço também. Hoje o almoço é
fora, na casa da avó Aurita, eheheheheh… estavam a pensar que era nalgum
restaurante fino?... Pois enganaram-se ou eu enganei-os. Vamos comer choupas
grelhadas - choupa é um peixe, por sinal óptimo, para quem não souber -com os
devidos acompanhamentos e a fatídica sopa, esta nunca ou quase nunca falha.
Para nos refazermos
da trabalheira que é almoçar fomos fazer uma folguinha quase colectiva, quase
porque a minha avó foi tratar dos destroços do almoço. É um trabalho sujo, eu
sei, mas alguém teria que o fazer. Sobrou para a dona da casa.
Descansados os
guerreiros do “marfanço” e digerido o objecto do cansaço, urgia dar um destino
à pandilha e este foi de consenso e unânime. Um saltinho à praia vinha mesmo a
calhar. O tempo ajudava e pedia e o corpo exigia. Logo não houve como dizer que
não, até se configuraria de apostasia.
Na praia. Oh! Na
praia. Mas que maravilha. Esplendorosa, fantástica, soberba, magnifica, etc e
tal…
A água mais
parecia sopa. O mar estava calmo e convidativo apesar da pequena ondulação que
o animava de um movimento lento, harmónico e indolente e que compelia ao “splash”, a um par de braçadas e à
brincadeira do chapinha-chapinha.
Construímos uma
piscina gigante, fazendo um paredão em areia molhada e em forma de ferradura
para possibilitar a entrada da água lateralmente, aproveitado o subir da maré,
mas impedindo a sua saída. Foi mesmo divertido e bastante pedagógico. Aprendi geometria
e estruturas, o funcionamento hidráulico do refluxo do mar e o estado da maré
propício à construção e consequente enchimento do dique. Realizámos uma
verdadeira obra de engenharia de barragens, onde executámos as mais finas e
requintadas tropelias e brincadeiras.
Porém, ainda que
muito bom, tudo tem um fim. O mar encheu em demasia, apossou-se da nossa
represa e destruiu-a, acabando com o sonho e a brincadeira. Todavia, o final da
tarde já se avizinhava, e com ele resolvemos recolher a trouxa, não sem antes
“colher-mos” umas fotografias artísticas, de um ângulo absurdo, que o meu pai
inventou, mas que se revelaram espectaculares. Não, não. Não vos vou contar o
segredo. Talvez vos mostre, só talvez…
Deixámos a praia,
com muito pesar meu, e parámos no apoio de praia poente, para refrescar ideias
e garganta. Seguidamente fomos lavar o corpo e a alma à casa de Quarteira da
avó Aurita, donde partimos para o jantar na Pizzaria Mammamia, na companhia da
tia Rosário, da prima Sofia Miguel e do tio Mário que já estavam lá em casa
quando chegámos. E como muitos fazem uma companhia lá fomos nós.
Não sou muito
adepta de pizza pelo que comi uma sopa de legumes fabulosa, enquanto o resto da
matula se repastou com pão de alho e pizza, intercalados por umas valentes
imperiais e Coca-Cola para a prima. Eu
bebi água.
Chegada a hora da
conta e da divisão da mesma, foi pagar e cada um fez-se à vida. Em comum, restou,
o espaço entre a Pizzaria e a casa da avó.
Cansada. Adormeci
quase de imediato. E, para dizer a verdade completa, foi uma directa.
O domingo
revelou-se mais relaxado que o sábado. Todavia, a manhã já entradota na sua
provecta idade, foi ocupada pela “cafézada” no Tertúlia Café e o irremediável
momento de leitura do meu pai, este é quase como a Bíblia “sagrado”. Findo este
fomos fazer uma quase também irrevogável visita aos cavalos, desta vez é o meu
momento que, deslocados para estes lados, também se pode aferir enquanto
“sagrado”.
O tempo é um
comilão desmedido de segundos, de minutos e até de horas e aquele que passa já
não volta para trás e corre inexoravelmente para a hora de dar ao corta palha
ou ao serrote. Contudo, resta-nos uma incumbência a cumprir pelo caminho de
regresso, nos entremeios. O primo André espera-nos, enquanto comensal, em sua
casa. Nós somos a sua boleia para o almoço e o almoço é em “casa nostra”, é assim como “mi casa su casa” apesar do almoço ter um
menu assim para o italiano: Sopa de abóbora com espinafres e massa fusilis de variegados sabores e cores
acompanhada por peito de peru cortado aos bocadinhos-bocadinhos, isto é, mesmo
pequeninos, com molho de natas. Como vêm coisa simples.
A restante tarde
foi pacífica e descansada. Entre as brincadeiras com o primo e os meus país,
restou tempo suficiente para uma bela duma folguinha, para descansar a beleza,
e estragar o euromilhões do sono
nocturno que teimava em não se conciliar com a minha electricidade acumulada, que
só se dissipa sob a forma de energia despendida. Causando o desespero dos meus
país que queriam descansar e bater com a pestana no mundo do faz de conta que
conta mas afinal não conta porque geralmente ninguém se lembra ao acordar.
tÓ mAnÉ (in
Laura Solange dixit) - 2012.07.(06,07 e 08)
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