domingo, 14 de julho de 2013

O silogismo do eu

Eu não sou eu!?...
Este repto foi-me lançado pela minha filha, uma criança com 3 anos, 9 meses, 19 dias, 1 hora e 17 minutos, sentada na sua cadeirinha de transporte em veículo automóvel, enquanto aguardávamos que o portão eléctrico de dois braços, azul Pepsi, terminasse o seu curso de fecho. Quando me lança a afirmação ou a pergunta: Pai, eu não sou eu!?... Tão pequena, tão cheia de graciosidade e tão cheia de sabedoria que desconhece adquirida. E, assim, a petiz me compeliu a debruçar-me sobre este assunto.
Pois!... De facto ela não é ela, mas tão-só um “produto” semi-inacabado, que nós sociedade que a rodeia, procuramos arduamente que ela venha a ser, neste mundo que poderia classificar de um substantivo colectivo global. A sua visão simplória das coisas deixou-me perplexo, criou-me a sujeição à meditação sobre ela, sobre a sua verdadeira projecção no futuro e na implicação na sua vida.
Eu não sou eu!... Assim sendo, quem afinal sou eu?
Eu não sou eu?... Assim sendo, quem sou eu afinal?
Serei aquele “produto” indefinidamente ou mesmo infinitamente inacabado, imperfeito e incompleto, desde que nasço até que feneço ou que por fim me fino sem que o esboço, o esquisso, tenha deixado o estirador e chegado a desenho acabado? Ou o desenho foi terminado mas a obra ficou por concluir ou mesmo por iniciar?
Serei um mutante?
Um ser transfigurado filho de um tecido social amorfo, estereotipado e embrutecido pelos preconceitos? Que pede, melhor que exige, incessantemente para que me transmude e transfigure, para que me molde, enfim para que me esqueça do meu eu elementar, o meu “mim”, para que não seja, definitivamente, eu!
Tenta ser tu, tenta!... Gritou-me e grita-me o meu inconformismo inconsequente.
E, eu tentei! E, eu tento! E, eu fiz-lhe e faço-lhe a vontade! Deus sabe que sim. Contudo à custa de quê e de como…
Do mundo que desaba, inclemente, sobre o meu “mim”, usando e abusando da punição sistémica às condutas tidas por inconvenientes ou dissonantes ao padrão de uma mole global. Arremessou-me, primeiro, para um canto escuro, bafiento e encardido, todavia o meu “mim” continuava demasiado ruidoso, incomodava na sua incontinência. Aí, libertou-me, deixou-me vogar livre, pagando o preço do descrédito; só um louco age assim! Deixem-no que não sabe o que faz!...
Esta janela para o mundo, que, com a sua pequenina mão, uma criança abriu, injectou-me de desconformidade, de revolta!... E, por mim, e, por ti, filha, vou deixar que sejas o que tiveres que ser, que cresças como tiveres que crescer, liberta de pré-conceitos, livre no teu juízo… Nasceste livre porque hás-de viver e morrer encarcerada e acorrentada num mundo que não é o teu?
Parece que te estou a ouvir ainda: Pai, eu não sou eu!?... Pois bem, filha, vai livre, vai ser feliz.
Bem hajas filha!


tÓ mAnÉ   Editions

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